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SERRA DA MISERICÓRDIA A ÚLTIMA ÁREA VERDE DA LEOPOLDINA

 

 

Os dados históricos sobre a Serra da Misericórdia remontam ao primeiro ciclo agrícola. Nos séculos XVII e XIX servia como divisor entre as importantes freguesias rurais de lnhaúma e Irajá, que mais tarde se converteram em freguesias urbanas e finalmente em bairros da cidade do Rio de Janeiro.No Brasil, o modelo de desenvolvimento urbano-industríal adotado, gerou um incontrolável processo de migração e crescimento desordenado das cidades desde a década de 40 do século passado. 0 "inchaço", o crescimento desordenado e a poluição passaram a fazer parte integrante do cotidiano dos centros urbanos.

 

Inserida na bacia hidrográfica da Baía de Guanabara, a Zona da Leopoldina, situada no Município do Rio de Janeiro, é um reflexo desta equivocada política de urbanização sem planejamento e sem participação popular, que tem como principais conseqüências a baixa qualidade de vida (inclusive ausência de saneamento básico e abastecimento d'água adequado) e a favelização das encostas, Em função desta situação de exclusão social, o tráfico de drogas, a criminalidade e a violência -associados aos níveis elevados de desemprego, especialmente nas comunidades de baixa renda dominam quase todas as favelas cariocas.

 

A região abrange cerca de 43,9 km2, e está localizada numa faixa de planície entre a Baía de Guanabara e parte do Maciço da Tijuca. Na Região da APARU se encontram 19 bairros e diversas favelas. Entre os principais corpos hídricos destacam-se o Canal do Cunha, formado pelos rios Jacaré e Faria -Timbó, o Canal da Penha e os dos Irajá, Nunes e Ramos. Na área situa-se a Praia de Ramos, considerada pelos órgãos públicos a "mais poluída do Brasil".Dados de 1991 indicam que a população da Leopoldina corresponde a 11 % do total de habitantes do Município do Rio de Janeiro, ou seja, 597.699 habitantes, composta por 47,7% de homens (285. 101) e 52,3% de mulheres (312.598). Do total dessa população, 37% estão distribuídos em 69 favelas, 23% em 35 conjuntos habitacionais populares, totalizando 60% da população em habitações populares, e 40% no que se chama asfalto- (IPLANRIO, 1991).

 

A situação ambiental é gravíssima. Dados da FEEMA consideram esta bacia aérea a mais poluída da Cidade.A última área verde da região da Leopoldina. está deteriorada, com índices de mortes prematuras (em tomo de 1000 ao ano, segundo o Banco Mundial) por doenças, pulmonares, que atingem principalmente crianças e idosos, agravadas pela poluição química e de partículas em suspensão no ar, oriundas do parque industrial e das pedreiras que operam, sem controle ambiental adequado, no interior da Serra da Misericórdia. Tal situação é constatada por pneumologistas, dermatologistas e neurologistas e é visível nas estatísticas dos postos de saúde que atendem à população da região. Ressalta-se ainda que uma das áreas da Serra daMisericórdia, a comunidade do Complexo do Alemão, tem o maior número de casos de tuberculose de todo o Município.

 

A REGIÃO DETÉM 0 MENOR ÍNDICE DE ÁREA VERDE PER CAPITA DO MUNICÍPIO. Isto é associado de forma direta ao aumento da temperatura média local, configurando uma "ilha de calor", o que contribui para o agravamento das conseqüências da poluição atmosférica.A atividade de mineração destinada à construção civil provocou uma forte degradação da área, destruindo os topos de morros, eliminando nascentes e a vegetação. Foram poucas as grutas e formações rochosas marcantes; da Serra da Misericórdia que resistiram à destruição. A Pedra da Penha e a Pedra Bicuda ainda resistem. A primeira por abrigar a Igreja da Penha, e a segunda por obra e graça da sociedade civil organizada.Apesar desta intensa descaracterização ambiental, a Serra da Misericórdia ainda apresenta mosaicos vegetais regenerativos de Mata Atlântica, onde dominam espécies gramíneo-herbáceas e arbustivo-arbóreas, constituindo-se em micro-ecossistemas mantenedores de bancos genéticos, representativos da vegetação original.

 

Os ecossistemas locais, formados por restitos da Mata Atlântica, constituem os últimos traços vegetais e refúgio de fauna da Região da Leopoldina que, em conjunto com o sistema de drenagem, configuram-se em zonas armazenadoras de água.Os mananciais existentes no entorno da Serra viraram valas de esgotos (ou valões) sem tratamento. Hoje é possível identificar apenas duas pequenas nascentes no interior da Serra da Misericórdia, ainda aproveitadas pela comunidade.Nos últimos cinco anos surgiram no entorno da Serra da Misericórdia várias iniciativas da sociedade civil, com o objetivo de preservar o que ainda existe deste ecossístema recuperar as áreas degradadas, contribuir para a melhoría da qualidade de vida e resgatar a cidadania da população.Juntamente com o fortalecimento desta rede cidadã, é imprescindível a ação efetiva do poder público estadual e municipal, no sentido de promover os investimentos necessários à recuperação ambiental e melhoria da qualidade de vida.

 

0 RECONHECIMENTO PELO PODER PUBLICO DA IMPORTÂNCIA AMBIENTAL DA SERRA DAMISERICÓRDIA E A CRIAÇÃO DA APARUA Lei Orgânica Municipal e o Plano Diretor da Cidade do Rio de Janeiro reconhecem o valor ambiental da Serra da Misericórdia, assim como sua importância como patrimônio paisagístico.Depois de cinco longos anos de luta, promovida por organizações ambientalistas e comunitárias, como a BICUDA ECOLÓGICA, VERDEJAR, OS VERDES, CONSA e o CEPEL entre outras, finalmente a Prefeitura do Rio através do Decreto No.19144, de16 de Novembro de 2000, instituiu a APARU (Área de Preservação Ambiental e Recuperação Urbana) da Serra da Misericórdia.A legislação federal, em especial a Lei Federal No. 9985/2000, que criou o Sistema Nacional de Unidades de Conservação (SNUC) e o próprio Decreto Municipal 19.144/2000, consagram a necessidade da participação da população na gestão das áreas de valor ambiental a serem preservadas. Para isso, é imprescindível envolver nesta teia de cidadania as escolas, igrejas, associações de moradores, a comunidade científica e o movimento ambientalista local.

 

A região tem potencial para se constituir num espaço de uso coletivo em atividades de lazer, educação, cultura e esporte. Há necessidade de se desenvolver pesquisas acadêmicas e projetos demonstrativos de educação ambiental.Em função disso, nós das entidades civis BICUDA ECOLóGICA, VERDEJAR, OS VERDES, CONSA e o CEPEL apresentamos ao Govemo do Estado, Prefeitura do Rio de Janeiro e à sociedade em geral as seguintes propostas de cunho sócio-ambiental, às quais estaremos engajados juntamente com outros segmentos sociais para transformar em Políticas Públicas.Desde já alertamos que os principais problemas da Leopoldina (inclusive de saneamento básico, recuperação ambiental da Serra da Misericórdia e o controle industrial) somente serão solucionados ou minimizados com a inclusão desta região que apresenta alta densidade populacional e concentra pontos críticos de poluição na segunda etapa do Programa de Despoluição da Baía de Guanabara, que se encontra atualmente em negociação pelo Govemo do Estado com agentes financíadores extemos.PROPOSTAS:

 

1 - Nomeação imediata dos representantes da sociedade civil no Grupo de Trabalho, criado pelo Decreto No. 19.510, de 23 de Janeiro de 2001;

2 - Criação do Conselho Gestor da APARU da Serra da Misericórdia, com ampla participação da sociedade civil, instituições científicas e dos moradores,

3 - Estabelecimento de parcerias e cooperação institucional com universidade e centros de pesquisa como a FIOCRUZ, UERJ, UFRJ e UFF, com prioridade para a elaboração de um "Diagnóstico Preliminar Sócio- Ambiental da área do entorno da APARU da Serra da Misericórdia";

4 - Manutenção dos limites originais da APARU, previstos no Decreto No. 19.144/2000, e elaboração do Plano de Manejo e Uso Sustentável, com a definição das áreas apropriadas para uso comunitário, como atividades de lazer e esportes, trilhas, ciclovia e montanhismo (que hoje já é praticado na Pedra da Bicuda), assim como as áreas a serem recuperadas.

5 - Implantação de um Parque Público e área de lazer na Rua Sérgio Silva- lnhaúma, com a reconstrução do campo de futebol destruido pelos tratores dos "grileiros" em 1999;

6 - Ampliação das áreas de atuação do Projeto Mutirão Reflorestamento, da Secretaria Municipal do Meio Ambiente, com prioridade para as Ruas Sérgio Silva e Maracá, e sua urgente implantação na Vila Cruzeiro. No reflorestamento destas áreas deve-se priorizar a contratação de mão-de-obra das comunidades locais;

7- Sinalização ecológica e cercamento da APARU, com prioridade para os trechos das Ruas Sérgio Silva e Flexal (lnhaúma), Maracá (Jardim do Carmo), e comunidades da Matinha, Mineiro e Cabloco ( Complexo do Alemão);

8- Cadastramento, pela Secretaria Municipal de Habitação e Defesa Civil, das famílias de baixa renda que vivem em área de risco geológico (sujeitas à deslizamentos) como no caso da Rua Maracá (Jardim do Carmo) e das dez casas situadas no final da rua Jangada (Vila Kosmos), e em ocupações irregulares existentes no interior da APARU, promovendo o reassentamento em lugar próximo e habitável, conforme prevê a Lei Orgânica Municipal e o Plano Diretor da Cidade. Assim como embargar, imediatamente, loteamentos e construções irregulares nessas áreas, onde. inclusive ocorreu "grilagem" de terras públicas, como no caso da Rua Sérgio Silva (lnhaúma);

9 -Execução de projetos demonstrativos de Educação Ambiental e Sanitária, tendo como enfoque a recuperação ambiental da Serra da Misericórdia;

10- Inclusão das micro-bacias situadas no em tomo da APARU da Serra da Misericórdia no PDBG-2 (segunda etapa do Programa de Despoluição da Baía de Guanabara), a ser financiado pelo BID e pelo Govemo Estadual. Revitalização das nascentes presentes na serra, com reflorestamento das matas ciliares. Todos os canais e rios da região encontram-se extremamente poluídos, causando graves problemas de saúde pública (doenças de veiculação hidrica) e contribuindo para a poluição das praias das Ilhas do Governador e do Fundão, assim como da Praia de Ramos;

11- Desativação total das Pedreiras que exploram na Serra da Misericórdia, poluindo demasiadamente o ar das comunidades situadas no entorno da Serra, principalmente os Bairros de lnhaúma e Engenho da Rainha, onde pode-se constatar nos postos médicos da região um alto índice de alergias respiratórias. Levando-se em consideração, o fato de onerar o setor de saúde pública, e a perda de horas de trabalho que tais problemas acarretam (carga de doenças), com o conseqüente prejuízo para os moradores da região e mesmo para a economia, tal atividade configura-se contraproducente;

12- Cobrança do passivo ambiental (dívida por poluição) provocado ao longo dos anos, pelas mineradoras e saibreiras localizadas na Serra da Misericórdia, que contribuem decisivamente para tomar a Zona da Leopoldina a mais poluída da cidade do Rio de Janeiro devido à poluição atmosférica. Este passivo ambiental deve ser pago pelas mineradoras, conforme a legislação vigente, que determina que o agente poluidor é responsável pela degradação, sendo obrigado a reparar os danos ambientais (conforme o Art. 14 da Lei Federal 6938, que estabelece a Política Nacional do Meio Ambiente, e o Decreto Federal 99.274/90, assim como a Constituição Federal, Art. 225, parágrafos 2 e 3 estando o poluidor ainda sujeito à sanção penal e administrativa;

13-Recuperação das áreas degradadas, após o fechamento (ou desativação) das pedreiras, com amplo reflorestamento e destinação de algumas áreas de fácil acesso para serviços essenciais como escolas e unidades de saúde, bem como iniciativas de geração de renda, atividades culturais, esportivas e outras que promovam a integração da comunidade,

14- Reconquista e recuperação dos espaços públicos (praças e logradouros). Arborização de todas as ruas dos Bairros que fazem parte do entorno da APARU. Execução dos projetos já existentes de praças, parques e jardins;

15- Implantação de uma Lona Cultural na Serra da Misericórdia (numa pedreira desativada ou na área de lazer da Rua Sérgio Silva). Esta Lona deverá ser administrada por um Conselho Gestor Comunitário, em conjunto com a Secretaria Municipal de Cultura.

16- Cessão do espaço público da antiga Creche Municipal da Rua Pescador Josino (Serrinha-Madureira), à comunidade, para instalação de um Centro Sócio Cultural;

17- Ampliação do Projeto Favela-Bairro nas comunidades de baixa renda, situadas na Serra da Misericórdia, trazendo infra-estrutura de abastecimento d'água, saneamento básico e drenagem;

18- Incentivo à coleta seletiva de lixo, e apoio à formação de Cooperativas de catadores como forma de gerar novos postos de trabalho, e eliminação dos vazadouros clandestinos de lixo;

19- Questionamento, inclusive através do Ministério Público, do projeto elaborado pelo Departamento de Hidrologia da COPPE/UFRJ (Coordenação dos Programas de Pós-Graduação em Engenharia), contratado pela Secretaria Estadual de Meio Ambiente e a SERLA (Superintendência Estadual de Rios e Lagoas), que não dispõe de Estudo de Impacto Ambiental (EIA/RIMA) e se limita à dragagern de cerca de 10 milhões de m3 de todo do Canal do Cunha, o que poderá provocar o espalhamento dos metais pesados e sedimentos acumulados durante anos naquele local. Apenas a dragagem não soluciona os problemas de poluição dos rios e canais que desembocam no canal do Cunha. É preciso um amplo programa integrado de saneamento ambiental, controle das inundações e fiscalização do parque industrial:

20- Requerer uma perícia técnica independente, através do MP, com o objetivo de realizar a análise dos sedimentos e da água, visando avaliar a proposta de dragagern em grande volume do lodo do Canal do Cunha, que será oneroso aos cofres públicos e poderá provocar forte impacto ambiental para a Baía de Guanabara, podendo atingir inclusive as áreas remanescentes de manguezais;

21- Questionar a limitação técnica e ambiental do Projeto do Piscinão da Praia de Ramos, a fim de esclarecer a opinião pública que o mesmo não soluciona em definitivo os problemas de poluição da região, nem contribui para a despoluição efetiva da Baía de Guanabara: representando uma prática de "maquiagem ecológica'. apesar de apresentar aspectos positivos como o tratamento paisagístico do local e a montagem de uma Lona Cultural,

22- Exigência junto a FEEMA (Fundação Estadual de Engenharia do Meio Ambiente) e a SMAC (Secretaria de Meio Ambiente da Cidade do Rio de Janeiro) da instalação de uma rede permanente de monitoramento da qualidade do ar da região da Leopoldina, que é considerada a bacia aérea mais poluída do Rio de Janeiro;

23- Exigência, inclusive através do Ministério Público estadual e federal, da realização de uma Auditoria Ambiental (prevista pela Lei Estadual No 1898191) do sistema de saneamento básico de toda a região da Leopoldina, que é administrada pela CEDAE (Companhia Estadual de Águas e Esgotos) e apresenta baixa eficiência, reduzida cobertura, polui os rios e a Baía de Guanabara. Cobrar investimentos para a melhoria e ampliação desse sistema;

24- Exigência à CEDAE (Companhia Estadual de Águas e Esgotos) de investimentos visando a ampliação do sistema de abastecimento de água da . região da Leopoldina, que apresenta significativo déficit especialmente nas áreas de favelas e de populações de baixa renda;

25- Cobrança à FEEMA (Fundação Estadual de Engenharia do Meio Ambiente) e à SMAC (Secretaria de Meio Ambiente da Cidade do Rio de Janeiro) de um rigoroso controle das principais empresas poluidoras da região (pedreiras, indústrias, etc). Preparação de um inventário a partir das informações disponiveis,

26- Organizar e capacitar as entidades civis locais, a partir da experiência que será proporcionada no Conselho Gestor da APARU, para participarem da criação e funcionamento de um futuro Comitê de Bacia Hidrográfica, conforme prevêem as Leis federal (9433/97) e estadual (3239/99) sobre Recursos Hídricos.Em função disso, solicitamos a análise das propostas acima relacionadas e a apresentação de um cronograma público de investimentos visando a execução e implementação das ações e programas indicados como prioritários neste documento.Rio de Janeiro, 10 de Julho de 2001.BICUDA ECOLÓGICA;VERDEJAR - Proteção Ambiental e Humanismo;OS VERDES - Movimento de Ecologia Social;CONSA - Conselho Comunitário de Saúde do Complexo do Alemão,CEPEL, Centro de Pesquisas e Estudos da Leopoldina.APEDEMA/RJ -Assembléia Permanente de Entidades de Defesa do Meio Ambiente,C/C Procuradoria Geral da República (PGR)Ministério Público do Estado do Rio de JaneiroComissão de Defesa do Meio Ambiente da ALERJCREA/RJ - Conselho Regional de Engenharia e Arquitetura

Capa da Carta

Cartaz de Divulgação

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